terça-feira, 17 de janeiro de 2012

O presente que eu levaria para Deus

Andei pensando...

Se me fosse dada a chance de, ao subir aos céus, levar algo para Deus, em uma demonstração de gratidão pela vida que Ele um dia me concedeu, o que eu levaria?

Não sei dizer ao certo o motivo, mas já me peguei várias vezes me fazendo esta pergunta.

Pensei nas coisas bonitas que há na Terra; plantas e animais exóticos, belas paisagens naturais, etc...

Não serve.

Essas coisas foram criadas por Deus, e portanto seria uma desfeita devolver a Ele.

Decidi então que teria que ser algo feito pelo homem. Uma peça de artesanato? Não, melhor não. Tem coisas que acho que Deus não ia gostar. E simplesmente não vejo esta cena: Deus decorando o céu com um berimbau de lá do mercado modelo.

Já pensei em levar uma rede. Sei lá, rede me lembra paz, achei apropriado. Mas fiquei pensando no mico de Deus não caber na rede, agradecer meio sem graça e dar a rede pro amigo secreto dele na confraternização de Natal. E por sinal, se no céu tiver comemorações de fim de ano, eu espero que lá ninguém coma peru. Peru simplesmente não tem gosto de nada, porque a gente se obriga a comer peru no Natal?

Se bem que acho que não haveria mesmo como comemorar o Natal no céu, pois como seria a árvore de Natal? Um pinheirinho, decorado com neve de isopor? Muito europeu. Como se o céu ficasse logo acima da França, quando todo mundo sabe que o céu fica acima de Itaparica. Mas enfim, voltando ao assunto.

Eu, depois de muito pensar, decidi o que levaria pra Deus: brigadeiro de colher. Explico.

Deus inventou o cacau, porque queria que o homem inventasse o chocolate. Mas porque Deus não fez logo o chocolate, certo? Bom, tenho para mim que faz parte do Seu plano, nos permitir crescer não nos dando coisas prontas. E por isso Ele nos deu o cacau, e não o chocolate. O chocolate é o cacau evoluído. É o cacau batizado e crismado.

Além do mais, algo me diz que Ele gostaria de comer brigadeiro de colher.

E tenho certeza de que isso mostraria a Ele o quanto fiquei grata pela minha passagem na Terra.

Será que Ele se ofenderia se eu levasse duas colherinhas?

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Devaneios sobre a morte

A morte é uma piada de mau gosto.

É a história contada pela metade, o livro sem a última página.

Não é exatamente uma ausência, é talvez a presença de um vazio.

Certamente é necessária, para que os ciclos da vida tenham continuidade. E quem sabe, haja também ciclos após esta vida.

Não sei.

Mas confesso que esta é uma idéia que me intriga...

Não quero viver pra sempre, dá preguiça só de pensar.

Mas dá um vazio estranho e desconcertante, imaginar que um dia não terei mais tempo para olhar um pôr do sol, ver a beleza das flores, ou simplesmente observar o tempo passar. Fiquei melosa...mas falando sobre este tema, acho que é inevitável.

Acho que o espírito permanece. De alguma forma, existiremos. Veremos então o pôr do sol? As flores? O passar do tempo?

Não sei.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Poema ao caroço

Era um dia tão simples, tão descuidado,

Desses que a gente esquece a porta aberta

Ou que esquece do fogão ligado

Que se deu tão sádica descoberta;

Alguns diziam: é só uma inflamação!

Outros falavam: Será um inchaço?

Mas esta é a melhor explicação:

Na certa, o buraco é mais embaixo.

De uma coisa ninguém duvida,

Isso aí é um baita dum caroço.

Mas será que é só de muriçoca,

Ou daqueles de cavar o próprio osso?

Que comecem então os exames.

Que vexame!

Como pode um ser tão casto e tão pudico

A um estranho mostrar o seu furico?

Mas se não tem jeito, que seja...

Botem os peitos na bandeja.

Mas ninguém avisou a esse patife

Que peito não se amassa feito bife?

Outros exames e vexames se seguiram

Até se chegar a uma conclusão:

O caroço não é de muriçoca

É um filhote de cruz-credo com o bicho-papão.

Mas o pior mesmo é a cirurgia:

Como é que pode um cidadão

Tirar de nós um belo naco

E lá deixar o buraco?

Que saco!

Já não bastasse toda a agonia

Que nos faz perder o raciocínio

E aquela bendita ultrassonografia

Que nos deixa a xuxeta ao escrutínio?

Mas o médico, homem muito estudado,

Permanece firme, e dá o alerta:

“A gente opera, abre e corta!

Depois vem outro médico e conserta!”

Ninguém respeita mais nenhuma lei?

Ora, mas que abuso!

Onde foi parar aquela lei

Que falava sobre uso e desuso?

Protelam-se os planos mais nobres

Que jamais pode prever a Medicina

No mesmo balaio, o rico e o pobre,

E “bye-bye” carreira de dançarina.

Mas, como diz todo cristão,

Quando se igualam sua fé e seu pesar:

“Aquilo que não tem remédio,

remediado está!”

E assim, ao médico mastologista

Pediremos que seja amigo do peito

E ao cirurgião plástico roguemos:

“Meu filho, me ajeite que eu te ajeito!”


A flor

Estava eu dirigindo, já atrasada, e o sinal fechou. Praguejei contra o semáforo – era a única coisa que eu podia fazer. Impaciente, olhei para o lado, e o que vi foi a cena que conto aqui.

No passeio da rua, andavam dois irmãos: um menino, que não devia ter mais que treze anos, e uma garotinha, que talvez tivesse cinco. Era tão pequena que fazia o garoto parecer um adulto ao seu lado. Estavam com a farda da mesma escola, andando de mãos dadas, as mochilinhas nas costas.

O menino checou o relógio e apressou o passo. Atrasado, assim como eu – supus. A garotinha, porém, estancou onde estava, puxando a mão do garoto e fazendo com que ele também parasse. Ele insistiu em continuar andando, mas a obstinação da menina o venceu. Ele fez uma cara de enfado, provavelmente sem paciência para as birras da irmã, principalmente estando com pressa. Fiquei imaginando: o que ela queria? Porque quis simplesmente parar no meio da rua, sem motivo algum?

O motivo foi esclarecido no momento seguinte. A garotinha havia percebido uma flor nascendo num canto, entre as pedras do passeio. Abaixou-se, colheu a flor, e a deu ao irmão.

A cara feia sumiu... O menino abriu um sorriso, daqueles que gritam “eu te amo”, sem precisar de nenhuma palavra. Pegou a flor, abraçou a garotinha, que envolvia os bracinhos pequenos no pescoço do irmão. Ele a beijou no rosto, e continuaram andando de mãos dadas.

A garotinha, afinal, não queria a flor para ela, e sim para o irmão. Com seus olhos puros de criança, viu um pequeno tesouro, que os adultos – cegos – teriam pisoteado. E dividiu seu tesouro com alguém, simplesmente por amor. Não queria platéia, ou mesmo ganhar em troca outra flor; queria apenas o carinho do irmão. De certo não faz idéia que eu a observava, e muito menos que um dia escreveria sobre ela.

Esta é a história de uma garotinha que sem saber, me convidou a desacelerar, pelo menos enquanto o sinal estivesse fechado. Se eu olhasse um pouco mais à minha volta, talvez visse tesouros também.

Comovida com a cena, eu me perguntei: “quando foi que parei de ter tempo para notar a flor no passeio”?

Ao meu filho

Filho querido, você não nasceu ainda.

Você é uma idéia, um sonho, um sopro no cosmos.

E, de uma maneira inexplicável, eu percebo sua presença. E te amo.

Você é uma criança tão bela!

Você começou a falar muito cedo, e desde então as palavras ficaram mais doces.

Todos os dias durmo ouvindo a sua voz, e acordo com saudade de sentir seu pequenino corpo no meu colo.

Filho, você é tão frágil!

Não ande descalço, menino! Vê se come tudo, e não senta tão perto da televisão. Pode ficar sossegado, o bicho-papão já foi. Se você se comportar, te compro uma bicicleta. Ah, meu amor, me perdoe! Claro que sei como você se sente.

Agora me abrace. Peça desculpas à professora. Dá um beijo na mamãe. Escreve para mim: “eu te amo”.

Filho, você é tão forte!

Nos dias mais cinzentos, seu olhar inocente é um arco-íris. Quando andamos na rua de mãos dadas, é para que eu não caia. Quando te coloco para dormir, também sinto medo do escuro.

Ainda não sei se você será um advogado ou um pintor.

Também não sei se você vai gostar de teatro ou cinema, se vai comer verduras ou pizza, se vai me contar seus segredos.

Há tantas coisas para saber! Tantas coisas a aprender com sua sábia ingenuidade, seu jeito espontâneo!

Um dia, meu filho, eu fui como você, e a vida era tão simples! Eu podia sorrir e chorar várias vezes no mesmo dia, e depois dormir tranquilamente.

Agora a vida é cheia de caminhos, e muitos deles me partem por dentro... Sinto saudades de você, pois você não chegou ainda.

Preciso de você.

Preciso que você precise de mim.

Aguardo, insone, que você venha me ninar.

O Papa é pop

É. O papa é pop. Era, melhor dizendo. Sabe o que isso significa? Que João Paulo II é pop. Mas e Karol Woitila? É isso mesmo o que eu quero sugerir: eles não são a mesma pessoa. Calma, não é uma teoria louca, como aquela que inventaram sobre os Beatles, dizendo que Paul McCartney tinha morrido, e um sósia tomara o lugar dele. Sou maluca, mas nem tanto. Só que, quando Karol Woitila (ô nominho infame!) consagrou-se como o pontífice, mudou até de nome e passou a se chamar "Joannes Paulus II". E passou a ser pop. De "pop"ular, mesmo.

Eu não sou lá muito religiosa, mas reconheço a maneira admirável que Karol Woit... quer dizer, João Paulo II viveu. Eu sei o que você está pensando: "E por que, então, eles não eram a mesma pessoa, já que eles eram a mesma pessoa?". Vou dizer. Certamente, você acompanhou (junto com o resto do mundo) a despedida longa e dolorosa do Papa. Fiéis de todas as nacionalidades prostravam-se à janela do hospital onde ele se encontrava, esperando por algum sinal. O tão esperado sinal, por fim, veio. O moribundo pontífice foi arrastado até o parapeito da janela, para que de lá pudesse abençoar uma última vez suas ovelhas. E assim o fez, com o semblante retorcido e agonizante.

Para sua sorte, dias depois desta dramática despedida ele se foi, contrariando as preces de muitas pessoas (ou muito carentes ou muito sádicas), que rogavam a Deus para que ele ficasse e expiasse um pouco mais. Pessoas dos quatro cantos do mundo, dos lugares mais improváveis, foram ver o corpo do Papa lá no Vaticano. Presidentes. Embaixadores. Ditadores. Líderes religiosos não-católicos. A "pop"ularidade de um cadáver nunca foi tão notória. Milhares de pessoas se aglomeravam nas ruas por até 18 horas, para terem a chance singular em suas vidas de ver o Papa - morto - por vinte (vinte!) segundos. Não pense você que isso é uma prova de fé ou de sacrifício pelo próximo. Isso é uma ode à necrofilia.

Imagino como seria se quem tivesse morrido fosse somente (não tão somente, diga-se) Karol Woitila. O diálogo entre fiéis talvez fosse algo como:

- Fiquei sabendo que morreu um polonês.

- Mesmo? Quem era?

- Era um líder revolucionário, que continuou à frente do seu tempo mesmo sendo um padre, sabe? Dizem que ele tinha uma visão de mundo bastante esclarecida, e que seus trabalhos levaram muitos líderes religiosos e políticos de todo o planeta a usar a fé como um instrumento de tolerância, e não de guerra.

- Que pena que perdemos alguém assim... Mas qual era o nome dele?

- Nome, nome mesmo, eu não lembro não. Mas sei que era nome de mulher!

- Polonês é tudo esquisito...